Não, este artigo não irá esmiuçar todos os segredos e personagens da capa de “Sgt Peppers”. Isso demanda uma coluna inteira.
Desde que me entendo por gente, sempre fui obcecado por capa de disco, essa arte fantástica que nasceu com viés de marketing e evoluiu em linguagem muito além do que jamais sonharia Alex Steinweiss, o designer nova-iorquino que concebeu o formato.
E esse “muito além” incorpora informações que habitualmente passam despercebidas, mas que possuem importância vital na mensagem que artistas querem comunicar. Porque música é muito mais do que o que sai pelo alto-falante do seu aparelho de som.
Veja abaixo sete capas que trazem alguns desses recados subliminares, não necessariamente os melhores ou mais icônicos, mas os que tenho apreço especial e fazem parte da minha coleção de discos.
1. THE ROLLING STONES – “Their Satanic Majestic Request” (1967)
Os Beatles estão na capa dos Rolling Stones. Mas não na forma da influência artística que “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” exerceu na incursão psicodélica de Mick Jagger e asseclas. Eles estão lá de fato.
Repare bem: a capa do álbum incluiu os rostos de Lennon, Paul, George e Ringo cercando os Stones em meio ao jardim e outros objetos da foto, não por acaso clicada por Michael Cooper, o mesmo do álbum dos Beatles.
2. BEATLES – “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” (1967)
Mas por que o Stones fizeram aquela referência? Não foi nada gratuita. A explicação está em outra mensagem não tão escondida assim.
Em “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, lançado meses antes e que os Stones ainda hoje são acusados de copiar, há uma boneca da atriz Shirley Temple.
O detalhe é que o brinquedo está vestido com um suéter estampando a saudação “Welcome The Rolling Stones” (“sejam bem-vindos os Rolling Stones”), com o complemento “Good Guys” (“caras legais”) na manga.
O easter egg, entre os muitos criados pela banda —tantos outros estão na cabeça de fãs—, está localizado sob as palmeiras do lado inferior direito da capa. Tiração de sarro? Ironia? Homenagem? Provavelmente os três.
3. BEASTIE BOYS – “Licensed to Ill” (1986)
Inspirados na grandiosidade do Starship, o luxuoso Boeing 720 que transportou o Led Zeppelin —e várias outras bandas na década de 1970—, os rappers, com seu senso de humor incontrolável, fizeram questão de causar em seu álbum de estreia, que trazia uma aeronave que se revelava curiosamente acidentada na contracapa do LP.
Mas há algo diferente na imagem: um número supostamente de série, 3MTA3. Que raios seria esse padrão, inexistente na aviação? Invertendo o código em um espelho, o mistério se revolve. Você enxergará “EATME” (“eat me”), um popular xingamento em inglês que também é usado nos Estados Unidos para se referir a sexo oral. Finos.
4. SANTANA – “Santana” (1969)
O primeiro disco da banda Santana —sim, era uma banda, liderada pelo lendário guitarrista Carlos Santana— ostenta a imagem preta e branca de um furioso leão, de autoria do artista americano Lee Conklin, famoso por seus cartazes da cena psicodélica. Mas há uma ilusão de ótica escondendo uma infinidade de figuras ali.
O “zoom” revela um animal composto por parte humanas. A cabeça, por exemplo, é feita de 9 faces. O queixo é uma saia hula, com pernas de bailarina abaixo. E, se você passar muito tempo observando a arte, provavelmente vai encontrar outras surpresas. Conselho: compre o disco e viaje.
5. THE POLICE – “Ghost in the Machine” (1981)
Você já se perguntou que “cazzo” é o código que ilustra a capa desse disco, o quarto do trio britânico, que foi inspirado na obra do escritor húngaro Arthur Koestler? Seria a manifestação da forma de um cristal líquido com traços inspirados em um cronômetro digital dos anos 1980? Na verdade não é nada disso.
Trata-se, na verdade, da representação gráfica dos três integrantes do The Police. E eles são estilizados com cabelo diferente. Da esquerda para a direita: Andy Summers, Sting com cabelo espetado e Stewart Copeland com franja. Por que fizeram isso? Porque simplesmente não conseguiam escolher uma foto suficientemente boa para o álbum.
6. GUNS N’ ROSES – “The Spaghetti Incident?” (1993)
Fãs com olhar mais clínico já devem ter notado a presença de uma pequena sequência de letras, números e símbolos na parte inferior da capa deste álbum de versões do Guns N’ Roses, que marcou o fim de uma era do grupo. Não é o número de catálogo da gravadora, como aparenta ser, e foi descoberto muitos anos após o lançamento.
Ali está a mensagem “FUCK EM ALL” (danem-se todos) grafada no código criado pelo famoso Assassino do Zodíaco, que praticou uma série de crimes na Califórnia no final dos anos 1960 e que em 2007 virou objeto do longa “Zodíaco”, de David Fincher. Nada mais condizente, afinal, com um disco trazendo uma cover escondida de “Look at Your Game, Girl”, composta por Charles Manson.
7. VELVET UNDERGROUND – “White Light/White Heat” (1968)
A capa negra desenvolvida por Andy Warhol conta com o que seriam dois elementos ocultos.
1) Uma tatuagem de caveira com a palavra “morte”, que só pode ser vista sob luz negra ou quando examinada de perto em determinado ângulo.
A tattoo pertencia a Joe Spencer, estrela do filme experimental “Bike Boy” (1967), dirigido pelo próprio Warhol.
2) Há quem jure existir um campo de estrelas que emerge em meio a nuvens ao se segurar a capa do vinil contra uma luz forte. Uma espécie de galáxia observada em um céu norturno. Ou seria só mais uma ilusão?
De qualquer forma, tal efeito do disco é lido por alguns fãs como uma das inspirações de David Bowie para seu trabalho de despedida, o elogiadíssimo “Blackstar” (2016).